Brasileiros desistem dos ovos de Páscoa e reforçam exportações

Por Isis Almeida e Gerson Freitas Jr.

Em um supermercado na Zona Sul de São Paulo, a copeira Lenita Lima procura entre centenas de ovos de chocolate pendurados sobre sua cabeça alguma opção para presentear sua filha e oito sobrinhos. Após alguns minutos, acaba desistindo.

“Está muito mais caro do que no ano passado”, disse Lenita, 40. “Nosso salário não aumenta no mesmo ritmo”.

Com o dinheiro mais curto, brasileiros acostumados a comprar ovos de chocolate na Páscoa para amigos e familiares estão abandonando o hábito devido ao aumento dos preços em meio à crise econômica. O comércio já se prepara para vendas menores. O faturamento com a venda de ovos de Páscoa está em queda de 13% neste ano, descontada a inflação, segundo a associação de supermercados do país, a Abras.

Com o consumo doméstico em baixa, o Brasil tem ampliado suas exportações de manteiga de cacau, uma das principais matérias-primas usadas na produção do chocolate. Em 2015, os embarques aumentaram 61%, atingindo o nível mais alto desde 2007. As vendas para o exterior seguem aquecidas neste ano, segundo dados do governo.

Crise do Brasil

“Não há dúvidas de que estamos em crise — temos uma economia muito deprimida”, afirma Thomas Hartmann, chefe de estatísticas da Associação Comercial da Bahia, de onde vem a maior parte do cacau produzido no Brasil. As exportações são “um reflexo do consumo reduzido de manteiga de cacau no mercado brasileiro”.

O Brasil enfrenta a recessão mais longa em um século diante da desaceleração da China e a queda nos preços de commodities como soja e minério de ferro. Nos últimos 12 meses, o real perdeu mais de 15% de seu valor. Neste cenário, um ovo com 375 gramas de chocolate é vendido por até R$ 45 reais em um supermercado na capital paulista, ou 5% do salário mínimo.

Sensível ao preço

O crescimento das vendas de chocolate no Brasil desacelerou pelo segundo ano seguido em 2015, segundo a empresa de pesquisas Euromonitor International, de Londres. Embora as vendas ainda estejam crescendo, os consumidores do país estão “muito sensíveis aos preços”, com apenas 23 por cento deles colocando a qualidade do chocolate acima do preço, afirma Marcia Mogelonsky, diretora de insight, alimentos e bebidas da empresa de pesquisa de mercado Mintel.

Segundo a Abras, que projeta uma queda nas vendas de Páscoa neste ano, apenas as encomendas de produtos mais baratos, como barras e bombons, devem crescer este ano. Os ovos de páscoa respondem por cerca de um quarto da receita com a venda de chocolate no ano, segundo a empresa de pesquisa Nielsen.

Embora ainda faltem algumas semanas para a Páscoa, as exportações de manteiga de cacau do Brasil aumentaram no ano passado porque as fabricantes de chocolate suspenderam temporariamente as compras do ingrediente. As produtoras normalmente compram no atacado vários meses antes de seus produtos acabados chegarem às prateleiras. A manteiga usada na fabricação de ovos de Páscoa normalmente é adquirida no quarto trimestre do ano anterior ou no início do primeiro trimestre do ano.

As exportações de manteiga de cacau do Brasil subiram para 26.993 toneladas no ano passado, e mais da metade teve os EUA como destino, segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex). Os embarques saltaram 80% no segundo semestre, o que levou a uma redução no processamento de cacau na América do Norte. Segundo a Associação Nacional de Confeiteiros dos EUA (NCA, na sigla em inglês), o esmagamento de amêndoas de cacau registrou uma contração de 3,3% nos últimos três meses de 2015.

A demanda por manteiga de cacau no mercado doméstico brasileiro provavelmente continuará baixa devido à desaceleração do mercado de chocolate do país, enquanto as empresas moedoras manterão o processamento das sementes que são transformadas tanto em manteiga quanto em pó, disse Hartmann. Em janeiro, as vendas ao exterior aumentaram 54%, atingindo o nível mais elevado para o mês desde 2008, segundo dados do governo.

“Enquanto a manteiga estiver sendo produzida, porque tem que ser produzida, e não for absorvida pelo mercado interno, as exportações continuarão elevadas”, disse Hartmann.

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