Por Josué Leonel e Vinícius Andrade.
Os ativos brasileiros seguem dando um banho na comparação com os pares globais. Nos últimos 12 meses, o real é a melhor entre as 16 principais moedas globais, com ganho de 25%, enquanto o Ibovespa dobrou seu valor em dólar no período, superando todos os demais índices de ações, e os juros futuros despencaram no mercado antecipando uma Selic de um dígito ainda este ano.
O otimismo do mercado com as reformas do governo Temer é um dos motores dessas apostas, juntamente com a queda da inflação e o esperado fim da recessão. A grande questão é o quanto desse otimismo já está embutido nos preços, tornando menor o potencial de ganhos adicionais daqui para frente, e quais cenários ainda podem gerar movimentos de alta — ou queda — adicionais dos ativos brasileiros. Confira sete variáveis-chave do mercado e como elas podem se refletir nos preços:
1) Reforma da Previdência – Na ambiciosa agenda de reformas de Temer, a mais desafiadora e com maior potencial de impacto no mercado é a da Previdência, vista como crucial para conter o crescimento dos gastos públicos e da dívida. O ganho dos ativos brasileiros nos últimos meses já refletiu a expectativa de aprovação da reforma, que cresceu após as seguidas vitórias de Temer no Congresso, mas isso não significa que ela esteja totalmente precificada.
Se a versão da reforma enviada pelo governo, vista como rigorosa pelos analistas, for aprovada na íntegra, os ativos deverão ter ganhos adicionais, pois seria um resultado surpreendente. “Aprovar sem nenhuma concessão é praticamente impossível”, diz Ricardo Sennes, da consultoria Prospectiva. O próprio governo já deu dicas de qual ponto é inegociável: a idade mínima de 65 anos, diz Sennes. Para os demais, como a regra de transição, o governo não tem sido enfático, o que sugere haver espaço para negociação. No que diz respeito ao prazo, aprovar toda a reforma, sem concessões relevantes, no 1º semestre também seria uma surpresa positiva. O mercado conta com a aprovação no segundo semestre.
2) Risco Lava Jato – Entre os fatores políticos que estão no radar dos investidores, esse é um dos que estão carregados por mais incerteza. Afinal, o rumo das investigações depende não do Congresso acompanhado de perto pela mídia, mas da Justiça e da Polícia Federal, cujo trabalho é naturalmente sigiloso, o que torna o desfecho do processo imponderável. Ainda assim, fatos recentes como a homologação da delação da Odebrecht, que poderia trazer citações a políticos, incluindo o presidente Temer, têm sido acompanhados pelo mercado com relativo sangue frio.
Sennes, da prospectiva, avalia que a Lava Jato deve gerar tensão, mas sem desestabilizar o governo. Ele vê 80% de chances de Temer terminar seu mandato. Mesmo que as delações atinjam tantos políticos quanto já foi divulgado, o processo no STF tende a demorar, estendendo-se a 2018 ou depois. No caso do julgamento da chama Dilma-Temer, que também ameaça o presidente, a tendência também seria de postergação.
3) Eleição de 2018 – A sucessão de Temer é um tema crucial, sobretudo ao investidor direto, aquele que investe na economia produtiva, com prazo de retorno muito maior do que o representado pelos ativos financeiros. Embora as pesquisas ainda mostrem candidatos de oposição como Lula e Marina na liderança, Sennes avalia que, caso se confirme o cenário de maior crescimento com inflação baixa em 2018, as chances de um candidato ligado ao governo aumentarão bastante. Para ele, a recente união de PMDB, PSDB e DEM em torno das eleições no Congresso foi um prenúncio. “Esse pode ser o núcleo de um candidato para presidente.”
4) Retomada do crescimento – A escalada dos ativos brasileiros, que ganhou força no início de 2016 com as apostas no impeachment de Dilma Rousseff, ocorreu a despeito da piora das expectativas de crescimento da economia. Os economistas do mercado ainda veem o país saindo da recessão este ano, mas com um crescimento raquítico, de 0,49%. Uma expansão maior, ainda assim apenas moderada, viria apenas em 2018, com 2,25%.
O fato de a média do mercado ainda estar cética com o vigor da economia pode representar uma oportunidade de ganhos para alguns ativos. A produção no próximo ano deve refletir, entre outros fatores, a atual queda dos juros, que tem sido acelerada pelo Banco Central. Caso o PIB surpreenda positivamente, resultados das empresas também serão maiores. O UBS Wealth Management, por exemplo, prevê um PIB pouco acima do consenso em 2018, de +2,6%, com possibilidade de o dado ser ainda maior. “Não é desprezível que o PIB de 2018 tenha um upside, o que seria positivo tanto para a bolsa quanto para o real”, diz Ronaldo Patah, estrategista do UBS Wealth.
5) Inflação na meta – Embora a convergência do IPCA para a meta venha rapidamente se tornando um consenso, alguns analistas também veem espaço para os ativos financeiros avançarem em caso de novas rodadas de números menores. “Se o cenário de inflação abaixo da meta começar a se consolidar, o mercado pode revisar para baixo a projeção de Selic”, diz Flávio Serrano, economista sênior do banco Haitong. “Uma inflação que começa a ficar abaixo do centro da meta pode estimular a aceleração do ritmo de cortes.”
6) Juros do Fed – A alta dos juros do Fed vem ocorrendo e não está gerando impacto significativo sobre o real ou outros ativos de países emergentes, como se temia alguns anos atrás. Desde que essa alta continue gradual, o efeito sobre os ativos de risco deve continuar suave. “Duas altas do Fed estão precificadas e há o risco de três elevações, ainda não totalmente precificadas. Vindo só duas altas, isso terá efeito positivo para bolsa, câmbio e curva de juros”, diz Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho do Brasil. “Três elevações é o número que teria um impacto mais negativo para o mercado.”
7) Risco Trump – Os mercados internacionais tiveram um forte solavanco logo após as eleições americanas, mas desde então alguns ativos, como o real brasileiro e até mesmo o muito mais sofrido peso mexicano, se recuperaram. Os investidores parecem trocar a visão negativa mais generalizada por uma postura mais complexa, considerando quais ativos podem ser afetados por específicas políticas de Trump. Bancos, por exemplo, poderiam ser favorecidos pela desregulação financeira prometida pelo presidente americano. Ações ligadas a commodities, por sua vez, chegaram a ser impulsionadas pelos planos de Trump de investimentos em infraestrutura.
Trump, contudo, tem sido um dos pontos do cenário externo que mais geram dúvidas. Um dos maiores temores é o de que o governo americano toque uma política fiscal expansionista, o que poderia pressionar a inflação e levar o Fed a acelerar os juros. “A incerteza em relação ao cenário externo e ao que será política fiscal de Trump é muito alta”, diz Solange Srour, economista-chefe da ARX Investimentos. Apesar de o fator-Trump ser um dos motivos do fim do chamado ”interregno benigno” no cenário externo, como citado pelo BC em seus documentos, a economista vê o mercado ainda dando o “benefício da dúvida” ao presidente americano.
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