Por Patricia Lara, Vinícius Andrade e Josue Leonel.
Mercado mostra uma tendência de estender o prazo previsto para que o Banco Central volte a subir a Selic, após o fim do atual ciclo de flexibilização. Com a retomada gradual da economia, analistas debatem até quando o hiato do produto — diferença entre o crescimento do PIB e seu potencial de expansão — seguirá em nível deflacionário, permitindo que as taxas sigam baixas. As conclusões de analistas ouvidos pela Bloomberg se movem na direção de juros baixos por mais tempo.
Se antes o mercado apostava em retomada do ciclo de alta ainda neste ano, alguns economistas já veem uma elevação do juro somente em 2019 — ou até mesmo no ano seguinte — e para um nível menor do que se pensava algumas semanas atrás. Pesam as surpresas favoráveis da inflação corrente, o recuo das expectativas e o passo lento do processo de recuperação econômica.
Para Mauricio Oreng, estrategista sênior do Rabobank no Brasil, a recuperação aponta para a fechamento dos hiatos existentes no fim de 2020, fazendo com que seja cedo para fazer a remoção dos estímulos em 2019. Oreng considera que seria mais apropriado a volta da Selic para 8%, começando a subir apenas em 2020.
Gap maior no mercado de trabalho
Na pesquisa semanal Focus, a mediana das projeções para a taxa Selic no fim de 2018 está em 6,5%, enquanto a estimativa para o juro no final de 2019 encontra-se em 8%. A estimativa média para o fim do ano que vem, entretanto, já está em 7,75%.
Para Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Fibra, o hiato continua negativo e “bastante deflacionário”, o que ajuda a abrir espaço para o BC estender o corte de juros. Para ele, com a economia se recuperando, o hiato tende a se fechar, mas vagarosamente. Existe uma defasagem no tempo que leva para o fechamento do hiato de cada segmento da economia afetar a inflação, mas Oliveira observa que o mercado de trabalho é o que está com hiato mais negativo e é o que mais demora a reagir.
O economista do Fibra lembra ainda que o Brasil sempre teve uma inércia inflacionária forte, mas que hoje, em tempos de inflação baixa, essa inércia tem um “caráter benigno” e joga a favor de altas menores de preços. Ele prevê que a Selic subirá 100 pontos em 2019, para 7,25%, após cair este ano para até 6,25% em maio.
Pode não ser tão grande
O presidente do BC, Ilan Goldfajn, alertou recentemente que a inflação baixa não é explicada apenas por um hiato elevado e que mesmo esse número é difícil de estimar, podendo não ser grande quanto se estima. Além do fato de a economia estar em recuperação, Ilan ponderou que pode ter havido alocação de investimentos em áreas erradas ou mesmo fechamento de capacidades, o que também complica as estimativas.
“2019 é o ano da verdade para a política monetária”, diz Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. A tríade “hiato do produto muito elevado, deflação dos preços de alimentos e competência do Banco Central, por sua credibilidade em manter inflação minimamente próxima da meta”, que ajuda a explicar o comportamento da inflação sob controle, começa a ficar mais nebulosa em 2019. Para o ano que vem, a expectativa é que o BC tenha que subir juro para pelo menos 8%, segundo Vale.
“A taxa de juros deve subir para perto de 8%, 8,5% no primeiro semestre de 2019, de maneira preventiva. O BC não vai esperar o fechamento do hiato”, diz Flavio Serrano, economista sênior do banco Haitong. Para ele, a tendência é que o hiato se feche ao longo do ano de 2019.
“Todo mundo espera a recuperação do hiato nos próximos dois anos. Há alguma diferença quanto à velocidade, mas talvez o principal seja o ponto de partida. Uma coisa é hiato de 2 pontos, outra é de 4 pontos. Fato é que, nos dois anos, perdemos capacidade de avaliar de maneira mais precisa, por conta de recessão”, diz Serrano.
Preços e expectativas pesam a favor
A Tendências Consultoria revisou recentemente o momento de alta de juros pelo BC no próximo ano, passando do primeiro para o segundo semestre. “Temos várias medidas de hiato, vários cálculos e, em nenhuma delas, chegamos perto de 7%, 8%. Nossos números estão mais perto de 5%. Isso significa que o hiato fecha em 2019 e, assim, o BC já teria que reagir no fim do ano que vem”, diz Alessandra Ribeiro, economista da Tendências.
O comportamento benigno dos preços e o recuo da inflação projetada, contudo, permitem que a Selic permaneça em nível baixo por mais tempo, segundo a economista da Tendências.
A política monetária está abaixo do nível neutro e, ainda que taxa neutra possa ter caído, é razoável vermos a Selic voltando para 8% ou 9% em 2019. A tendência é que política monetária se normalize, diz Rafael Ihara, economista da Ethica Asset.
“BC também não sabe qual é a neutra, tem a mesma dúvida do mercado, e ao longo do ciclo vai tateando, a ideia não é jogar taxa lá para cima, pode ser algo entre 8% e 9%. Se tiver inflação mais forte, pode colocar acima do nível neutro”, diz Ihara. Para ele, houve mudanças importantes de redução de política parafiscal e aumento da credibilidade do BC, que deveriam contribuir para reduzir a taxa neutra. Mas a situação fiscal segue indefinida e parece ser uma grande aposta a da queda da taxa neutra, diz.
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