Por Simone Iglesias e Samy Adghirni.
Para o bem ou para o mal, os presidentes e os partidos há muito confiam na tradicional política do toma-lá-dá-cá para aprovarem projetos no Brasil. Agora, o presidente eleito Jair Bolsonaro tenta um caminho diferente.
Com dezenas de partidos no Congresso, os presidentes brasileiros se acostumaram a governar sob o presidencialismo de coalizão, que consiste na troca de posições ministeriais e na estrutura do governo por apoio no Legislativo. Mas, depois dos escândalos de corrupção desvendados pela Operação Lava Jato, Bolsonaro escolheu não negociar diretamente com partidos, optando por um governo de economistas, militares do alto escalão, moralistas e políticos escolhidos por ele mesmo, em vez de deixar que partidos imponham nomes de seu interesse.
Os futuros ministros da Economia, Paulo Guedes, e da Justiça, Sergio Moro, ganharam carta branca de Bolsonaro para montar suas equipes e, mais do que isso, para determinar todas as políticas desenvolvidas por suas áreas, o que inclui presidências do Banco Central e da Petrobras, projetos de ajuste fiscal e mudanças nas leis de combate à corrupção e ao crime organizado.
Assim como Guedes e Moro, os militares também têm plenos poderes nas áreas de coordenação estratégica, infraestrutura e minas e energia. Bolsonaro surpreendeu escolhendo o general Carlos Alberto dos Santos Cruz para o cargo mais político do ministério, a Secretaria de Governo, responsável nas últimas décadas por atender a pedidos dos mais variados dos parlamentares em troca de votos em projetos de interesse do governo.
“Não estamos negociando com partidos, mas com bancadas, e desta forma estamos atingindo todo o Parlamento”, disse Bolsonaro na semana passada. “O modelo que vigora ainda, de ministério por votos, não deu certo. Mergulhou o Brasil numa ineficiência e corrupção.”
Embora essa estratégia pareça coerente com a promessa de campanha de romper com a política tradicional, congressistas estão céticos quanto a um resultado efetivo nas votações de interesse do governo, como as reformas tributária e previdenciária.
“Bolsonaro tem tido um estilo muito diferente de tudo que vimos na relação com o Congresso e esse estilo vai ser colocado à prova. Não sei se esse diálogo direto governo-parlamentar sem passar pelas bancadas, pelos partidos, se sustenta. Tenho hoje dificuldade de apostar no sucesso desse modelo. Não fomos chamados para construir juntos. Até este momento, nós, como Congresso, temos sido espectadores, os partidos principalmente”, disse o deputado Roberto Lucena (Pode-SP).
Paralelamente ao ceticismo do Congresso, a ala política do futuro governo é a menos alinhada das quatro e na qual surgiram mais problemas até agora. Bolsonaro estabeleceu o critério de não negociar com dirigentes partidários, mas de buscar nos partidos nomes que o agradam. Essa estratégia causou alguma turbulências, já que o DEM, partido do já nomeado chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, emplacou três ministros (além de Onyx, Tereza Cristina na Agricultura e Luiz Henrique Mandetta na Saúde), num governo que busca reduzir a estrutura.
O PSL, partido de Bolsonaro, cuja bancada é a maior dentre as governistas da Câmara, tinha apenas um ministro, o astronauta Marcos Pontes na Ciência e Tecnologia, até a última quarta-feira. Foi então que Bolsonaro decidiu nomear o deputado Marcelo Álvaro Antônio, do PSL de Minas Gerais, para o ministério do Turismo. “A preocupação do partido com participação no governo foi sanada com a nomeação do ministro do Turismo. A antiga forma de negociação não deu certo, criou um Legislativo acovardado. Todos os deputados do PSL têm a missão de mudar isso. Se for para seguir trocando cargos, será traição ao povo que nos elegeu”, afirmou a deputada Bia Kicis (DF), eleita pelo PRP, mas de mudança para o PSL.
General da reserva e vice-presidente eleito, Hamilton Mourão disse na última quinta-feira em um evento em Brasília que os congressistas precisam entender o novo momento pelo qual passa o Brasil: “O trabalho a ser feito não é pouco e vai exigir articulação com o Congresso. Acredito que eles vão entender o momento que o país vive”.
Apesar dos esforços de Bolsonaro, há sinais de que a realpolitik está começando a se reafirmar. O presidente eleito escolheu um deputado sênior do MDB, o partido mais estreitamente associado à política do establishment, como ministro da Cidadania, pasta ao qual serão incorporadas cultura e esportes. Osmar Terra foi ministro de Michel Temer até abril, quando deixou o cargo para concorrer a deputado. Nesta semana, Bolsonaro convidou para audiências as bancadas do PR, PRB, PSDB e MDB. Até então e durante a definição da maior parte do ministério, o presidente eleito não havia se reunido com dirigentes partidários para negociar cargos em sua gestão.
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