Por Julia Leite, Felipe Marques e Vinícius Andrade.
Dois impeachments, três moedas diferentes e uma hiperinflação de até 2.500% ao ano fizeram de Fabio Alperowitch um gestor cauteloso com o Brasil.
O co-fundador da FAMA Investimentos, uma gestora de ativos com sede em São Paulo e mais de duas décadas de existência, é mais conservador do que boa parte dos pares sobre as perspectivas para a reforma da Previdência. Alperowitch se diz receoso com a euforia que levou o preço de algumas ações a máximas históricas, com a aposta na aprovação da agenda de reformas pró-mercado do presidente Jair Bolsonaro.
“Eu bati a cabeça na parede muitas vezes”, disse Alperowitch em uma entrevista. “Estou de mente aberta para esse ’novo Brasil’, mas só vou acreditar em uma reforma ampla quando acontecer.”
Não que a cautela signifique que ele esteja ficando de fora do mercado, mas sim que está menos disposto a apostar em empresas de maior risco.
Alperowitch diz que o principal fundo da FAMA, que tem cerca de R$ 2 bilhões sob administração, está “praticamente 100%” investido, preferindo em empresas que sobreviveriam mesmo se a reforma der errado, mas que também se beneficiariam de um aumento no crescimento econômico. Nessa lista estão grandes empresas que, mesmo durante os anos de crise, conseguiram obter crédito a taxas razoáveis. A Localiza, a Raia Drogasil, a Klabin e o laboratório Fleury estão entre as atuais apostas do fundo.
Setores
Mesmo que a bolsa esteja perto de níveis recordes de alta, as empresas ligadas ao consumo interno não acompanharam os ganhos e ficaram atrás de outras, como bancos e Petrobras.
“Se houver algum revés nas reformas, as ações que subiram mais sofrerão mais”, disse ele. “E se as reformas progredirem, as empresas de consumo terão um rali”.
O principal fundo de ações da gestora teve um retorno de cerca de 8.400% desde sua criação, duas décadas atrás – cerca de quatro vezes o retorno do Ibovespa durante o período.
O fundo de ações da FAMA foi um dos primeiros administrados por um gestor independente, no início dos anos 90, de acordo com Alperowitch. Ele administrava a empresa da casa de seus pais com um amigo de faculdade, Mauricio Levi. O nome da FAMA é uma combinação da primeira sílaba dos nomes dos parceiros.
A falta de estrutura e de dinheiro no início – Alperowitch diz que a dupla tinha US$ 20 por mês em receita líquida – significava que eles não tinham recursos para pagar por dados de negociação em tempo real e pesquisa ou acesso a executivos de primeira escalão. Em vez disso, fizeram trabalho de campo, frequentaram os supermercados para conversar com os clientes e concentraram-se em empresas menores, com as quais poderiam ter a chance de alcançar executivos mais bem posicionados.
A estratégia em grande parte persiste até hoje. A empresa não investe em empresas com valor de mercado superior a R$ 50 bilhões, ou naquelas que estão em setores com excesso de regulação ou que dependem muito de fatores que não são controláveis pela empresa, como os serviços públicos. Mais surpreendente ainda, Alperowitch diz que nunca – “sob nenhuma circunstância” – investiu em uma ação estatal em seus 25 anos no mercado.
Muitos dos concorrentes de Alperowitch estão menos pessimistas do que ele. Uma pesquisa do Bank of America com 32 gestores mostrou que 80 por cento acreditam que uma revisão do sistema previdenciário do país será aprovada no segundo semestre do ano, com uma economia de cerca de R$ 700 bilhões em 10 anos. Alperowitch disse que “não é tão otimista com uma reforma robusta”, e acredita que uma aprovação é improvável antes do final do ano. Suas opiniões são parecidas com as de Rogerio Xavier, um dos gestor de fundos mais reverenciados do Brasil, que também acha que os investidores estão subestimando os obstáculos à reforma.
“Se a reforma não acontecer agora, não sei quando teremos uma confluência de fatores como a que temos hoje”, disse Alperowitch. “Eu gosto de olhar para o longo prazo, mas no Brasil eu simplesmente não consigo.”