Por Shan Anwar.
Historicamente, as tesourarias corporativas eram responsáveis apenas pelas principais atividades de financiamento da empresa. Nesse contexto, os tesoureiros eram financiadores das linhas de negócios constituintes da empresa e sua capacidade de agregar valor para a empresa era limitada.
À medida que o ambiente de negócios tornou-se mais complexo, entretanto, algumas empresas e suas tesourarias precisaram evoluir. A crise financeira mundial colocou a gestão de liquidez e risco em evidência, uma vez que a interconexão entre esses processos, antes separados, tornou-se óbvia. Esta ação deixa clara a necessidade de que mais atividades passem a ser centralizadas na tesouraria.
Quando as fontes de capital ficam escassas, o “financiamento” torna-se mais complicado. As atividades de financiamento requerem ferramentas para realizar hedge das emissões. As atividades de hedging precisam de uma infraestrutura para que executem e monitorem negócios. A globalização requer que o caixa seja administrado em várias moedas com diversos parceiros bancários. O ônus regulatório aumentou desde a crise financeira, demandando a gestão dos vários regimes regulatórios entre fronteiras. Todas essas atividades precisam ser administradas sob uma estrutura de gestão de risco que reconheça o apetite da empresa por risco.
Um modelo de tesouraria centralizado permite que os tesoureiros agreguem cada vez mais valor aos seus negócios e, por sua vez, tornem-se parceiros dos negócios subjacentes aos quais atendem. Em alguns casos, este modelo pode até somar no resultado final. Por exemplo, a centralização de todos os aspectos da gestão de caixa na tesouraria permite que os tesoureiros otimizem seu perfil de financiamento. Como resultado, a dívida externa pode ser reduzida, diminuindo a atividade de hedging. Os hedges de derivativos podem ser reduzidos ainda mais ao interligar as exposições do caixa consolidado nos diferentes negócios. Uma forma de pensar sobre o tema é que para cada US$ 100 milhões de redução no valor teórico do derivativo, as tesourarias podem economizar US$ 30.000 para sua organização (assumindo-se uma estimativa conservadora de economia de três pontos-base no spread de compra/venda).
Por que centralizar, em primeiro lugar?
A centralização elimina a duplicação do esforço em toda a empresa. Por exemplo, centralizar as operações de hedging e negociação elimina a necessidade de cada linha de negócio ter seus próprios traders e recursos de gestão de ciclo de vida da negociação. Os acordos com as contrapartes são otimizados, reduzindo o ônus operacional de administrar os diferentes acordos externos para diferentes pessoas jurídicas em sua própria empresa.
A gestão de caixa centralizada pode oferecer eficiências semelhantes. A relação com os bancos pode ser otimizada em regiões e parceiros com os quais a empresa negocia. A administração centralizada dos pagamentos interbancários aumenta o controle sobre essas transações, reduzindo juros e outras reivindicações contra a empresa. O financiamento interno é sempre mais barato do que o externo, de forma que a centralização do caixa na tesouraria permite que a organização aproveite fundos ocultos que podem estar disponíveis nas operações internas.
A gestão centralizada de risco permite que a empresa concentre a gestão das exposições subjacentes que dão origem aos riscos financeiros. Nesse contexto, a gestão de risco permite que os tesoureiros administrem o risco de liquidez, de mercado, de crédito de instituições financeiras, de commodity e operacional. Tal ação permite que as linhas de negócios concentrem-se no risco do negócio e do cliente – sua maior expertise.
As funções financeiras e contábeis também podem ser centralizadas nas transações financeiras da tesouraria. Isso permite que a empresa recrute pessoas com experiência específica, por exemplo, em designar derivativos sob regras contábeis de hedge ou nas complexidades de avaliar derivativos para relatórios financeiros (p. ex., incorporar o risco de não desempenho da sua contraparte bancária). Especialmente para as regras complexas que regem a contabilidade de hedge, a experiência e a expertise em designar hedges podem salvar sua empresa das análises desconfortáveis dos seus auditores.
O diagrama abaixo resume algumas das principais funções que podem ser centralizadas na tesouraria.
Barreiras à centralização
Por que mais corporações não centralizam as operações de tesouraria hoje? Algumas corporações podem acreditar que uma abordagem “híbrida” funciona melhor para seus negócios; por exemplo, as subsidiárias têm a tarefa de identificar as exposições relacionadas à sua linha de negócio e pedem para as operações da sede executarem os hedges.
Entretanto, os maiores impedimentos à centralização são as limitações tecnológicas. Embora as atividades da tesouraria estejam vinculadas umas às outras, poucos sistemas oferecem a capacidade integral de conectar gestão de caixa e gestão de hedge, exigindo pontos ou interfaces de contato manual e manipulação de dados.
Muitas tesourarias administram as exposições projetadas de caixa em planilhas, por exemplo, tornando a agregação das exposições no nível consolidado um processo demorado e sujeito a erros. Os sistemas que oferecem tal funcionalidade são dispendiosos e sua implementação leva meses, senão anos.
Outras barreiras incluem:
- Falta de recursos – as tesourarias já têm funções enxutas em suas empresas. De acordo com uma pesquisa da AFP de 2014, 54% das tesourarias contam com menos de cinco funcionários em tempo integral. Dadas as atuais restrições de recursos, pedir para os tesoureiros fazerem mais exigirá o realinhamento dos recursos existentes para a tesouraria.
- Falta de estrutura – uma abordagem holística da gestão de tesouraria requer uma estrutura para identificar as várias funções que precisam ser centralizadas, além de identificar funções e responsabilidades para a forma como essas funções devem ser gerenciadas.
- Falta de dados – relacionados às limitações de sistema mencionadas acima. Para gerenciar essas funções de forma eficaz, as tesourarias precisam de dados consolidados. No caso da gestão de risco, torna-se óbvio que uma empresa não pode gerenciar exposições que não conhece.
Como chegar lá
Dependendo da sua organização, o nível de esforço necessário para mudar para uma estrutura de tesouraria centralizada pode ser grande. Em geral, as etapas a seguir podem ajudar na jornada para a centralização:
- Defender a ideia para a diretoria executiva – os benefícios da centralização podem não estar claros para a alta administração da sua empresa. Por exemplo, a organização pode estar acostumada com as diferentes linhas de negócios que gerenciam e fazem hedge das exposições financeiras de forma independente. Como na maioria dos casos, defender o argumento do custo/benefício pode ter grande impacto nesta situação. Ou então, você pode estimar os custos de hedging (em termos de pessoas, spreads de compra/venda, custos de transação etc.) das diversas negociações de hoje em relação aos benefícios de executar menos negociações sob uma estrutura centralizada e interligada.
- Estabelecer políticas – quando a diretoria executiva compra a ideia, as políticas que governam as atividades da tesouraria ajudam a eliminar qualquer ambiguidade nos processos agora centralizados. As políticas devem esquematizar funções e responsabilidades, tanto para as tesourarias quanto para as linhas de negócios, e procedimentos de escalonamento claramente definidos. Um benefício importante da documentação é ajudar a padronizar processos e assegurar que a próxima etapa possa ser alcançada.
- Centralizar processos e sistemas – com as políticas estabelecidas, agora é hora de executar. Os tesoureiros devem procurar eliminar, ou pelo menos padronizar, operações manuais usando planilhas e consolidar vários processos que, historicamente, foram desempenhados no nível de negócio. Da mesma forma, a consolidação e padronização de dados é uma peça central na equação da centralização. Uma solução integral de gestão de tesouraria é fundamental para possibilitar a transformação da centralização. Um sistema único, integrado e automatizado garante que o mesmo sistema no qual você insere suas transações seja aquele no qual você contabiliza e analisa sua gestão de risco.
Otimizar os benefícios da centralização
A centralização é um processo iterativo – uma jornada contínua. Onde quer que a organização esteja nessa jornada, ela pode aproveitar a oportunidade para refletir se suas operações foram otimizadas e estão em vigor, transformando-as de operações de negócios a parceiras de negócios. As melhores tesourarias se perguntam:
Eu analiso o caixa da minha empresa de forma transacional ou holística?
- Gestão holística de caixa – uma visão completa de saldos bancários, necessidades de liquidez de curto prazo (por meio de contas a pagar ou receber, por exemplo) e projeções de caixa de longo prazo possibilita otimizar relacionamentos bancários e melhorar o retorno sobre o caixa por meio de agregação de caixa e gestão do balanço-alvo.
Eu tenho uma visão completa das exposições financeiras da minha empresa?
- A gestão holística de caixa leva a uma visão consolidada das exposições. Os tesoureiros podem então adotar medidas para mitigar de maneira eficaz o risco de suas exposições por meio de ações de hedging ao interligar essas exposições, por exemplo.
Minhas atividades de hedging são executadas com eficiência?
- A negociação eletrônica dos derivativos de mercado de balcão reduz os custos da execução. Soluções como correspondência de confirmação eletrônica permitem que a confirmação e a liquidação ocorram automaticamente.
Eu sou capaz de usar ferramentas de gestão de risco para mitigar todo o universo de risco da empresa (p. ex., risco de mercado, de crédito, de conformidade/regulatório, operacional)?
- Entender e definir o apetite de uma empresa por risco é o primeiro passo para usar as ferramentas de gestão de risco com eficiência.
- Feito isso, as melhores empresas integram a política de risco em seus sistemas de execução – limites de exposição, limites dos traders, limites de crédito da contraparte – e garantem a conformidade com as exigências regulatórias.
Para simplificar, quanto tempo eu passo coletando informações versus analisando informações?