Por Marco Maciel.
Se o Banco Central do Brasil não aumentar a taxa Selic em breve, a meta de inflação poderá não ser alcançada em 2017 em função de eventuais choques advindos da desvalorização cambial, do provável déficit fiscal (primário) e da possível alta de preços administrados, superior às expectativas. Nas semanas anteriores, o comunicado e a ata da última reunião do comitê de política monetária (Copom) sugeriram que o Banco Central está disposto a conviver com inflação mais alta ao longo de 2016.
O tom da última ata, divulgada em 29 de outubro, indica que o intervalo de tempo requerido para a convergência da variação do IPCA para o centro da meta de inflação (4,5%) deslocou de 2016, período demarcado na penúltima ata, para um “período de tempo apropriado”. Baseado no relatório da inflação de setembro, isso significa que o Banco Central estaria confortável em esperar até o segundo trimestre de 2017 para que a inflação ao consumidor retornasse para 4,5% ao ano.
Quando o Copom votou na última semana de outubro a favor da manutenção da taxa básica de juros em 14,25% ao ano, as interpretações dos documentos de comunicação entre o Banco Central e o mercado variaram entre posturas menos e mais conservadoras da instituição. Por incrível que pareça, ambas as interpretações são válidas.
Se a base comparativa dos documentos do Copom de outubro for o conjunto de discussões de agosto, o tom da atual política monetária seria mais conservador. As interpretações sobre a política monetária ideal naquele momento vis-à-vis a perspectiva de fraca atividade econômica giravam em torno da eventual redução da taxa básica de juros (taxa Selic) ao longo de 2016. No entanto, se a comparação for com o comunicado e com a ata de setembro, quando o Copom afirmava o seu compromisso com a convergência da inflação para o centro da meta em 2016, a mudança do tom do colegiado em outubro penderia para leniência monetária. A introdução da expressão “período de tempo apropriado” para a convergência da inflação implica que o comimtê não elevaria a Selic no ano que vem e que este patamar seria suficiente para levar a inflação para 4,5% só em 2017.
Há três razões pelas quais os tons das comunicações do Copom mudaram.
Em primeiro lugar, dado o fato de que o PIB real deverá contrair 3% este ano e 2% no próximo, o Copom busca aliviar a pressão sobre o tombo da atividade econômica, especialmente em 2016.
Em segundo lugar, o governo estabeleceu uma meta de déficit primário em 2015 de 0,85% do PIB, valor que foi revisado para baixo em 27 de outubro em relação à perspectiva de superávit de 0,15% do PIB. Se o crescimento das receitas fiscais permanecerem abaixo das expectativas – ou se o governo continuar a reconhecer mais despesas atrasadas (ou “pedaladas”) correspondentes a 2014 – o déficit fiscal pode aproximar-se de 1,9% do PIB em 2015, colocando mais pressão sobre a inflação.
Além disso, se o PIB do próximo ano e a arrecadação tributária forem inferiores às perspectivas governamentais, a previsão para o superávit primário de 2017, atualmente igual a 0,7% do PIB, poderia passar para um déficit de 0,3%. Este cenário provável comprometeria a convergência para a meta de inflação de 4,5% em 2017, eventualmente forçando o Banco Central a elevar a Selic em pelo menos 100 pontos base no ano que vem.
Em terceiro lugar, , a tendência do real é permanecer relativamente fraco em relação ao dólar norte-americano no curto prazo. A permanência da taxa média de câmbio entre 3,9 reais/dólar e 4,1 reais/dólar entre o quarto trimestre de 2015 e o final de 2016 contribuiria para uma taxa de inflação seis pontos percentuais mais elevada no próximo ano e também em 2017.
Esses três fatores sugerem que o IPCA não covergiria para a meta de 4,5% até o segundo trimestre de 2017. Esta análise incorpora os efeitos de ambos os choques fiscais e cambiais sobre a inflação projetada em relação à trajetória mais comedida de inflação produzida pelo Banco Central no relatório de inflação de setembro.
Atingir a meta inflacionária de 4,5% no segundo trimestre de 2017 requer minimamente a manutenção da taxa Selic em 14,25% até o final de 2017, de acordo com análise da Bloomberg Intelligence Brasil. Assumindo a taxa Selic média igual a 14,25% entre o quarto trimestre de 2015 e o segundo trimestre de 2017, uma possível trajetória equivalente à caracterizada pela Selic estável em 14,25% até o final de 2017 e por desaceleração inflacionária até 4,5% durante o mesmo período seria produzida por uma majoração da taxa básica de juros em 100 pontos-base no ano que vem e pela sua diminuição em 125 pontos base em 2017.
A segunda opção seria ligeiramente melhor porque a taxa real de juros resultante igualaria 9,1% no terceiro trimestre de 2017, enquanto que a estabilidade da taxa Selic em 14,25% produziria um juro real de 10,3% no segundo trimestre de 2017. Ambos os juros reais são muito altos, mas a segunda opção envolve a recuperação da credibilidade da política monetária na faze de alevaçào da Selic enquanto que, na fase de flexibilização monetária, o Banco Central provavelmente fortaleceria a retomada na atividade econômica via recuperação do índice de otimismo empresarial.