Por Cristiane Lucchesi.
Os escândalos de corrupção tornam nebuloso o cenário político brasileiro, o que impede uma recuperação plena da economia, disse o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga.
“Seria de se esperar que uma recessão tão violenta fosse seguida de um salto na economia, mas atualmente parece mais um pequeno pulinho”, disse Fraga, sócio da empresa de hedge fund e private equity Gávea Investimentos, em entrevista. “A única razão pela qual não tivemos ainda uma forte recuperação é pela incerteza que ainda nos ronda.”
Apesar de mais de dois anos de uma contração econômica que atingiu quase 10 por cento — um recuo que Fraga chamou de “depressão” –, muitos empresários ainda têm capacidade ociosa e estão pensando duas vezes antes de investir em uma produção maior, disse ele. Há questões ainda sem resposta, como se o governo vai ou não elevar impostos, reduzir subsídios ou cortar seus próprios gastos, ou se o próximo presidente da República mudará a direção da economia do país nos próximos anos.
As novas revelações da Operação Lava Jato, com a divulgação de horas de vídeos com os depoimentos dos executivos e donos da Odebrecht contando como subornaram políticos de diferentes governos nas últimas décadas, também aumentam o descontentamento e a incerteza, segundo Fraga.
“O que nós estamos vendo é esse surpreendente espetáculo de corrupção completamente generalizada, e isso é venenoso”, disse Fraga, acrescentando que isso cria um solo fértil para um tipo de populismo que poderia acabar minando as tentativas de equilibrar o orçamento federal. Uma opção desse tipo seria “mais dolorosa do que a opção de ajustar”, disse ele.
Caso Odebrecht
A popularidade do presidente Michel Temer caiu para 9% na última pesquisa Ibope, divulgada pelo jornal O Estado de S. Paulo em 17 de abril. “Nesse momento não há visibilidade, há uma completa falta de confiança na política, nos políticos”, disse Fraga.
Nesse ambiente político já difícil, o governo tenta aprovar reformas impopulares que visam a reduzir o déficit fiscal cortando benefícios dos aposentados. E provavelmente também terá que aumentar os impostos, segundo o ex-presidente do BC.
“O governo anterior gerou o maior buraco já feito no orçamento, uma deterioração de 6 a 7 pontos do PIB”, disse Fraga, que presidiu o BC de 1999 até o fim do mandato de Fernando Henrique Cardoso e que chegou a ser anunciado como futuro ministro da Fazenda em 2014 caso Aécio Neves fosse eleito presidente da República no pleito daquele ano.
Necessário fazer mais
Um quarto da deterioração no déficit no orçamento pode ser atribuído à queda da arrecadação por conta da recessão, e isso pode retornar facilmente, disse Fraga. “Se você desfaz incentivos fiscais e todos os subsídios, isso também pode ajudar, mas muito mais vai ser necessário.”
Não será fácil cortar despesas porque boa parte do orçamento tem destinação certa, disse Fraga, o que significa que os impostos terão que subir para evitar um aumento na relação entre a dívida e o PIB.
“Eu tenho pregado a necessidade de impedir o crescimento das despesas do governo há muito tempo, mas o governo decidiu não fazer isso antecipadamente, e com isso nos resta um tipo de ajuste atrasado que pode a curto prazo exigir alguns impostos maiores”, disse ele. “Isso trará muito descontentamento.”
“Mas ainda acho que um aumento de impostos nesse momento é um mal menor”, completou.
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