Por Charlie Devereux.
Conselhos para os negociadores: não leiam as manchetes da Argentina até outubro.
Os mercados estão aprendendo a olhar para além dos ruídos na campanha presidencial da Argentina.
Três meses antes das eleições, o oposicionista Mauricio Macri prometeu eliminar os controles cambiais em um dia para depois dizer que isso seria um ato de “mágica”, e também está dizendo agora que vai deixar as empresas nacionalizadas sob a gestão do Estado. Daniel Scioli, candidato da aliança governista Frente para a Vitória, oscilou entre dizer que iria fazer mudanças graduais no atual modelo econômico e dizer que o apoia.
“O mercado antecipou-se em acreditar que Macri estava fugindo com ele e, em seguida, tornou-se excessivamente pessimista com a crença de que Scioli não representaria nenhuma mudança”, disse Patrick Esteruelas, analista sênior da Emso Partners, que gerencia 2 bilhões de dólares de dívida.
Os títulos em dólar regidos pela lei local da Argentina, com vencimento em 2024, variaram de 108 centavos de dólar, quando Macri estava na liderança, para 94 centavos após Scioli trazer um dos assessores mais próximos da presidente Cristina Fernández de Kirchner como seu companheiro de chapa. Os papéis foram negociados a 98 centavos em 13 de julho.
Os argentinos votam, em 25 de outubro, na primeira eleição, desde 2003, que não incluirá a presidente nem seu falecido marido, Nestor Kirchner. Um segundo turno será realizado em 22 de novembro, se nenhum dos candidatos obtiver 45 por cento dos votos ou mais de 40 por cento com uma vantagem de, pelo menos, 10 pontos percentuais.
Os investidores haviam antecipado que o vencedor iria mudar as políticas econômicas para atrair investimentos, tornar o peso mais competitivo e reduzir o déficit orçamental.
“Reflexo verdadeiro”
Agora esta premissa está em dúvida, com o anúncio do vice do candidato líder na disputa Scioli e seus elogios ao ministro da Economia, Axel Kicillof, que ajudou a levar a Argentina ao calote, recusando-se a cumprir as exigências dos credores.
O histórico de Scioli e o que ele disse a investidores nos bastidores mostram que seus planos não são muito diferentes dos de Macri, de acordo com Diego Ferro, codiretor de investimentos da Greylock Capital Management, em Nova York. Embora o ritmo das mudanças possa ser diferente, as promessas dos dois candidatos são essencialmente as mesmas, disse ele.
“Eu não sei se quando falam com os investidores eles dizem a verdade, mas definitivamente quando falam com seus eleitores eles dizem coisas que não são o reflexo verdadeiro do que pretendem fazer”, acrescentou Ferro.
Scioli tinha 36,9 por cento de apoio em uma pesquisa de junho realizada pela Management & Fit, em comparação com 31,6 por cento para Macri, um aumento de 4 pontos percentuais sobre maio. A pesquisa nacional, com 2.400 pessoas, tinha uma margem de erro de 2 pontos percentuais. Macri estava liderando nas pesquisas durante o primeiro trimestre.
Excessivamente otimista
As expectativas de que um novo governo será capaz ou estará disposto a implementar mudanças rápidas e substanciais são excessivamente otimistas, disse Mauro Roca, economista do Goldman Sachs, em um relatório publicado em 13 de julho. “O mercado está subestimando a complexidade de se chegar a um acordo com os credores holdout, o que impede a Argentina de fazer empréstimos nos mercados de capitais globais”, ele escreveu.
Com reservas subindo 24 por cento, para 33,8 bilhões dólares desde novembro, “o próximo governo ainda terá algum espaço de manobra para continuar adiando a resolução, se decidir fazê-lo”, escreveu Roca. “Por enquanto, considerações políticas – em vez de econômicas – podem continuar a prevalecer.”
“Os investidores não devem sempre levar os comentários dos candidatos à risca”, disse Esteruelas, da Emso. Macri já disse o suficiente para indicar que ele vai fazer alterações. “Scioli, que está atendendo a base de apoio do seu partido, provavelmente não vai mostrar suas verdadeiras intenções até ser eleito”, disse Esteruelas.
“Enquanto estivermos em campanha eleitoral, o lema é: ‘Não leiam seus lábios’”, disse ele.